Um ciclo fechado: demanda e oferta de gás e petróleo frente à guerra na Ucrânia

Um ciclo fechado: demanda e oferta de gás e petróleo frente a guerra na Ucrânia

Por Arthur Nadú Rangel

Na atualidade os maiores produtores de petróleo e gás podem ser visto abaixo:

Maiores produtores de petróleo

Observamos que os Estados Unidos da América mantêm a liderança na produção mundial por ampla margem, porém isto não se traduz em poder de barganha ou econômico internacional visto que a demanda interna deles é maior que a sua própria produção colossal. Com poucas exceções, os países que vêm em seguida na lista são em sua maioria exportadores do que grande consumidores. Assim os maiores produtores para exportação fazem parte da OPEP que organiza os seus interesses controlando a produção e o refino para o mercado global de países consumidores.

Maiores consumidores de Petróleo

Com a retomada econômica decorrente do fim da pandemia o consumo tendo a crescer muito, principalmente da República Popular da China que pode chegar a mais de 20 milhões de barris/dia até o meio do ano que vem.

Fontes alternativas

 Caminhamos, felizmente, para fontes alternativas de combustível, energia e industriais com menores impactos ambientais e sociais. Em muitos países como a Dinamarca, as dados de 2019 mostram a energia eólica como sua principal fonte energética. Na França a energia nuclear (considerada pela maioria acadêmica como energia limpa) representa quase 85% das fontes energia. O desenvolvimento econômico implica no maior consumo de energia per capita, comum dos processos mais refinados de consumo e do uso de produtos eletrônicos que facilitam a vida. Países desenvolvidos tendem a consumir, principalmente próximos a zonas frias, por ano de 10 a 30 vezes o consumo médio brasileiro de energia (aqui notamos que o brasil tem o mais baixo consumo per capita dos países em desenvolvimento, decorrente não de economia, mas de escassez de oferta de energia).

Consumo per capita de energia/ano

A questão central é que, mesmo com o avanço tecnológico dos meios alternativos, ainda estamos a várias décadas de conseguir substituir os principais meios de produção energética por meios limpos e adequados sem o uso amplo da energia nuclear. Talvez a corrente do petróleo e do gás só possa ser quebrado pelo desenvolvimento dos sistemas de fusão nuclear (que só devem começar a operar, na melhor das hipóteses, a partir de 2050). Substituir as fontes tradicionais de energia não é uma realidade atual, entretanto o advento do uso amplo do gás e do petróleo possibilita fontes energéticas de menor potencial poluente (frente a queima do carvão, a pior fonte energética da atualidade).

Ciclo fechado e OPEP

O conceito de ciclo fechado está relacionado ao fato de que os principais produtores das commodities energéticas mantêm boas relações entre si. Organizações como a OPEP têm exercido um controle absoluto sobre o preço do petróleo e do gás, garantindo que a oferta destes materiais seja apenas o suficiente para atender a demanda (e, às vezes, menor que a procura) com o objetivo de controlar de forma ativa o preço destes materiais e manter o elevado lucro operacional de seus membros. Em um sistema onde a oferta mal atende a demanda, não existe sobras de materiais, o não uso do petróleo por parte de um país será substituído pelo uso de outro fornecedor. Assim o gás e petróleo que se deixa de comprar de países como a Rússia ou Malásia será necessariamente vendido para outros países que apresentam a demanda. Já o gás e petróleo que os EUA passam a vender para a Europa é proveniente de deixar de vender este mesmo material para o Japão ou países da Ásia.

Nordstram 2

Os países que deixam de receber as commodities americanas ainda dependem de seus materiais, assim passam a comprar os mesmos produtos dos únicos fornecedores disponíveis no mercado: o que a Rússia deixou de vender para a Europa agora é comercializado praticamente na mesma quantidade para o Japão e outros países orientais.

Capacidade natural de energia eólica. Fonte: Real Life Lore

É um ciclo fechado, visto que tais commodities não estão sujeitas a regra da oferta e demanda (assim como todos os bens estratégicos). O valor acaba por não ser alterado e o prejuízo fica inteiramente para o comprador que tem que se adaptar a novos procedimentos burocráticos e novas rotas. A realidade de substituir por outras fontes energéticas é possível apenas para pequenos países desenvolvidos (lembrando que nem todos estão em condição geográficas de uma produção relevante energética alternativa de energia solar e eólica — vide a Alemanha).

Capacidade de produção de energia solar. Fonte: Real Life Lore

Prejuízo ao ocidente

Nesta troca de fornecedores em um ciclo de commodities fechado quem é o prejudicado? A Europa. O capitalismo europeu se desenvolveu buscando soluções mais convenientes para os seus problemas e a escolha da Rússia como fornecedora de 25% das fontes energéticas europeias não foi um capricho do destino ou um grande plano maligno, mas sim a pura conveniência do sistema de necessidades. O ocidente europeu necessitava de fontes de energia em grande quantidade e com baixo custo. O único país capaz e com relevantes fontes de recursos nas proximidades era a Rússia. O gás barato russo possibilitou o posicionamento da Alemanha como a quarta maior potência global e a elevação do IDH de toda a Europa a níveis elevados com baixo custo para as fábricas e moradias, possibilitando o conforto das casas e dos ambientes comuns.

           

Importações de Gás Europa

Não podemos dizer que o gás russo é insubstituível, mas os termos desta substituição torna impossível para a Europa manter o caminho de desenvolvimento social e conforto que existia. O kw/h do gás americano tem um custo médio de 40 euros, enquanto o kw/h do gás russo tem preço que varia entre 15 a 22 euros. Existe um limite para os países europeus poderem manter o subsídio energético em economias fragilizadas pela pandemia e pela guerra. O principal problema tende a aparecer quando o consumo se elevar com a chegada do inverno, aumento não apenas o consumo de gás para uso em produção energética, mas também in natura para os sistemas de calefação nas residências. Um inverno particularmente frio poderia significar uma tragédia não apenas econômica, mas também humana.

O preço da energia já atingiu patamares recordes de alta — ainda sem uma relevante situação de escassez — apenas pela especulação de mercado. Quando a energia começar a faltar, a tendência é que as pessoas deixem suas posições lógicas dentro do ambiente geopolítico para posições individuais e poucas coisas têm poder politico tão relevante na historia humana como a fome e o frio.