Por PEDRO PAULO REZENDE
A 16ª Reunião de Cúpula do BRICS Plus, que deve acontecer em agosto deste ano em Moscou, pode ser marcada pela adesão de dois gigantes: a Indonésia e a Nigéria. Os presidentes dos dois países, Prabowo Subianto e Bola Tinubu, já manifestaram o desejo de aderir ao bloco. Se forem aceitos, dois gigantes em população e em recursos naturais ampliariam o alcance do organismo — formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e que se expandiu com as adesões de Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.
A Indonésia, hoje, é o maior país islâmico em termos populacionais, com 272 milhões de habitantes, e caminha, graças à proximidade com a República Popular da China, para ser uma das maiores economias da Ásia. Sua pauta de exportações inclui, além de petróleo e gás, produtos industrializados, inclusive eletrônicos. A também islâmica Nigéria, por sua vez, detém o posto de maior economia e maior população da África, com 220 milhões de habitantes. É uma grande produtora de matérias-primas — principalmente produtos agrícolas, petróleo e gás —, mas também exporta minerais estratégicos, como tântalo e nióbio. Na área de manufaturados, é grande no setor têxtil.
O maior interesse dos dois países são a criação de um meio de pagamento alternativo ao SWIFT e os mecanismos de financiamento do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), criado em 2014, durante a 6ª Reunião de Cúpula, em Fortaleza, Ceará. Esta atuação coordenada dos sócios da organização em ambiente extrabloco, chamada de o BRICS Outreach, impacta o entorno de cada um dos países membros por meio das ações políticas e econômicas do bloco. Outra área de atuação está em ações concertadas junto a organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU), onde os sócios atuais atuam na defesa intransigente de uma reforma do Conselho de Segurança, com a ampliação do número de membros permanentes de quatro (por ordem alfabética, China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia) para sete integrantes. Somar-se-iam aos quatro grandes representantes para a África (provavelmente África do Sul ou Egito); América Latina, (Brasil), e Ásia (Índia).
Descrédito
O atual sistema de pagamento internacional, o SWIFT (sigla em inglês para Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication), sediado em Bruxelas, na Bélgica, enfrenta uma onda de descrédito a partir de ações tomadas pelos Estados Unidos que isolaram Cuba, Irã, Rússia e Venezuela do mercado internacional. A organização deveria fornecer uma rede de mensagens para instituições financeiras em todo o mundo, permitindo a transferência padronizada em transações bancárias internacionais. Atualmente, o sistema é usado por mais de 11 mil bancos em 200 países para intermediar de forma padronizada informações sobre transações financeiras. O grande problema, é que o sistema é vulnerável às sanções decretadas pelos Estados Unidos e pela União Europeia.
Cuba, Irã e Venezuela são bons exemplos: estão isoladas dos sistemas de pagamentos internacionais e têm dificuldades, inclusive, para adquirir alimentos e insumos médicos para suas populações, incluindo equipamentos de uso hospitalar e substâncias químicas para a produção de remédios. A interferência política de Washington e da União Europeia expôs a fragilidade do modelo e trouxe inquietude ao mercado, que apontou para a necessidade de uma alternativa. O tema já foi discutido em reuniões anteriores do BRICS. Outro ponto importante está na apreensão das reservas nacionais de países que não se submetem aos desejos ocidentais.
O Banco da Inglaterra impediu o acesso da Venezuela a sua reserva de 34 toneladas de ouro. Os depósitos do governo em euros e dólares, superiores a US$ 600 bilhões, também foram bloqueados nos Estados Unidos e na União Europeia. Para finalizar, ações judiciais em território norte-americano promovem o desmonte da CITGO, empresa distribuidora de combustível subsidiária da Petróleo da Venezuela S.A (PDVSA, estatal produtora de petróleo) que possui um patrimônio superior a US$ 200 bilhões em território estadunidense.
É preciso ressaltar que a República Popular da China e a Federação Russa já trabalham em um caminho alternativo ao SWIFT (sigla em inglês de Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication) e já emitem moedas virtuais lastreadas em ouro, as chamadas CBDC — sigla em inglês para Moeda Digital do Banco Central.
Rede de benefícios
Em termos econômicos, os investimentos promovidos pelo BRICS nos países membros aceleram o crescimento das nações vizinhas. Um bom exemplo está nos projetos firmados entre Brasil e China. Ao todo, serão financiadas 124 ações do governo federal para viabilizar a construção de uma ferrovia entre a Bahia e o Acre, interligando o Brasil à rede boliviana e peruana, chegando ao porto de Chancay, recentemente visitado pela ministra do Planejamento Simone Tebet. Isto permitirá que nossas exportações atinjam a Ásia com maior velocidade e custo inferior. Em contrapartida, produtos peruanos e bolivianos chegarão mais rápido e de maneira mais barata à África, à Costa Leste dos Estados Unidos e Europa.
O Brasil se transformará em um hub que interligará toda a América do Sul. Por meio da nova ferrovia, que cruza a Norte-Sul, os países da Costa do Pacífico poderão acessar os portos de Itaqui (no Maranhão), Salvador e Santos abrindo acesso ao Atlântico. É um bom exemplo dos benefícios do que se convencionou chamar de BRICS Outreach. Atualmente, na África do Sul, os projetos atingem, de maneira positiva, Angola, Botsuana, Lesoto, Congo (Kinshasa), Moçambique e Namíbia.
Efeitos similares já se verificam em todo o entorno da China, da Índia e da Rússia. Para medir o alcance real dos benefícios, economistas traçam círculos com o dobro dos limites territoriais ao redor dos países integrantes do BRICS. Chegaram à conclusão que o bloco, apesar de não institucionalizado, atinge positivamente todo o extremo asiático e a Eurásia, além da América do Sul e do Sul da África. É preciso reafirmar que além do peso dos negócios impulsionados pela infraestrutura dos membros do grupo, o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) investe em países ao redor do mundo financiando novas fronteiras agrícolas e industriais — as nações africanas começam a se transformar em polos têxteis e de transformação — o que amplifica o softpower da organização.
É óbvio que o bloco atraia o interesse de países que precisam de apoio financeiro e político para crescer. Já se manifestaram neste sentido Arábia Saudita, Argentina, Irã e Turquia. Egito e Indonésia também olham a ideia com interesse. Em um quadro onde a ordem unipolar impõe sua vontade, o BRICS serve como farol de liberdade econômica.

